Frei Cláudio van Balen
Fé e Cidadania
Textos
CAMINHAR - PEREGRINAR
VIVER: FECUNDA MUTAÇÃO
Caminhar faz usufruir do que se avista - do mistério que se traz no íntimo - aproximando a pessoa do aqui e agora. Caminhar é um esforçar-se, corporalmente, que muda o modo interior de avaliar e de agir. Peregrinar implica um fenômeno corporal a nos enriquecer no ver, ouvir, enxergar, entender. sentir, cheirar, admirar e decidir. A pessoa – caminhando - entra em contato com a natureza que, por sua vez, a confronta com seu próprio íntimo.
O caminhar nos questiona, alivia, amplia nossa visão, nos liberta interiormente e nos faz sentir o Mistério que envolve tudo e todos. É pelos pés que atingimos mente e coração, mudamos o modo de ser e de nos relacionar com pessoas e coisas, com desafios e ideais no lidar com a vida. Liberta-nos de pequenas e grandes obsessões que nos dominam e, também, nos confronta com o divino – o mistério que tudo e todos habita –questionando, sustentando e amadurecendo.
O peregrinar nos conscientiza do fato de que podemos existir; que somos todos iguais e de que as coisas não pretendem chamar tanto a atenção para si mesmas. Há algo mais em jogo, algo que em silêncio e simplicidade confirma que, no cotidiano, podemos existir vinculados a outros em situações variadas. Isso nos presenteia novos pontos de vista com perspectivas de fecunda criatividade. Caminhar purifica interiormente, confronta com a verdade e abre novas portas para o modo de existir, de relacionar e de agir.
A pessoa já não se prende à sua própria limitação e ao seu imediatismo, com interesse limitado frente a problemas. Tudo que se lhe apresenta ao redor: pessoas, ruas, casas e prédios; situações, campos, árvores e flores a insere no caminho que encanta com cheiros e valores a penetrarem no seu íntimo e nas suas relações. Também vilarejos, pessoas e grupos de participantes, com sua comunicação recíproca acima de línguas, hábitos, objetivos, proble-mas e sonhos contribuem para uma mudança interior e exterior.
Em tudo isso - por uma liberdade e verdade civilizantes - há o que liberta de uma perspectiva estreita, como ainda de hábitos, crenças e visões políticas mesquinhas. A perspectiva é relativizada e cresce o interesse pelo que transporta as pessoas para fora, para muito além e acima de si, tornando-as indivíduos mais abertos, acolhedores e desprendidos. Isto lhes presenteia com uma nova, ampla e rica interioridade, liberta-as de si e as aproxima do diferente como indivíduos mais nobres, livres e promissores. O interesse próprio dilui e impõe-se lhes uma mentalidade ecumênica, uma atitude franca de colaboração. O espaço interior de cada um se faz mais amplo, mais receptivo, simpático e encorajador.
Não há quem não passe pela experiência de uma mudança – inovação interior - que torna a pessoa qual porta aberta, dando acesso a outrem e a uma nova forma de ver, sentir, saborear e escolher. O espaço pessoal se amplia e passa a ser ricamente habitado, mostrando que o modo de viver pode ser diferente, mais leve, acolhedor e bem mais fecundo.
Viver de modo novo e mais feliz e transformador é possível. Em resumo, a caminhada passa a ser uma meditação física, envolvente e social, preparando a pessoa para um modo diferente e mais fecundo de marcar presença na família e na sociedade; como também de cuidar melhor de si e de tantos que se é chamado a beneficiar. Todas as dimensões do ser humano são atingidas e enobrecidas; o seu íntimo abre um espaço novo com gentil e rica receptividade.
Graças ao caminhar, o humano mais profundo é atingido e se faz receptivo para iniciativas que tornam a vida mais fecunda, socializante e libertadora, menos exigente e mais satisfeita com o indispensável. E eis a pessoa a peregrinar ou a caminhar, satisfeita com o que ela mesma é capaz de suportar. Desta forma, o viver se torna mais autêntico para si e, graças a ela, para outros. Quem ganha com isso é a convivência que tem na pessoa peregrina uma fecunda bênção a imprimir transformadora irradiação ao conviver.
F.Claudio - 14.08.2015
ESPÍRITO RENOVADOR
(Pentecostes) / Textos: Atos 2,1-11; e João 20, 19-23:
Originalmente, Pentecostes era uma festa de colheita; depois tornou-se festa da Aliança no Sinai; festa da Torah, das “Dez Palavras” (Decálogo) que orientam a vida de fé do povo. Hoje se fala de vento e fogo, de ruído e congraçamento, de harmonia e abertura em meio à realidade como manifestação do amor de Deus. O espírito de Jesus – seu jeito de ser e agir - irrompe nos discípulos, os envolve e inspira. Se a Páscoa traz a libertação do pecado e da morte, da opressão e do medo, Pentecostes gira em todo do amor, o novo Mandamento testemunhado por Jesus e que ecoa no coração de cada pessoa.
O Evangelho nos reporta ao primeiro dia da semana, os apóstolos ainda com medo nos corações e com as portas trancadas, quando se convencem que, em e por Jesus, Deus é perdão, solidariedade e paz. É preciso devolver a alegria aos excluídos e abandonados. Nossa verdade há de revestir-se de um sorriso, nossa avaliação há de gerar perdão, nossa religiosidade há de ligar-se à vida e às pessoas e, jamais, prioriza ordem, medo, vingança e exclusão.
Agora, já não se trata de lei, mas de espírito – o “ruah”, sopro, chama simboliza a leveza de nosso Deus, o poder de seu amor. Toda rigidez seja abandonada, toda alienação banida. “Venho para fazer novas todas as coisas”. As pessoas não existem em função do peso da lei, pois o objetivo da lei é o bem-estar das pessoas, sua vida, suas relações com boa qualidade. Todos terão de viver a partir de seu coração, de sua sensibilidade humanitária, em vista de uma convivência que se faz apelo e exercício de solidariedade humanitária.
O que, cada dia, temos de fazer, isso não consta, previamente, em prescrições e códigos, não depende simplesmente de ordens. A nova referência é Jesus, lição e exemplo para todos e de cujo espírito, indistintamente, participamos. Agora, há um caminho de fé e bondade, de compaixão e solidariedade, de renovação e comunhão, de criatividade e participação. Pentecostes: lição exigente e promissora! Rica promessa, caminho seguro, lição sempre de novo a ser aprendida e testemunhada.
Somos lembrados de que o Espírito, em vez de usar a mediação de algo pesado em doutrinas, códigos de tradições, em normas e disciplinas, ele traz a leveza do vento e o calor do fogo. E eis que a leveza envolve todos que ficam admirados; a comunicação vence os obstáculos das mais variadas ‘línguas’ ou de sistemas legais para lidar, amorosamente, com vida, pessoas no ritmo de relações. Sim, o Espírito vai direto ao íntimo do coração humano e, sem complicações ou ameaças, toca diretamente todos, confrontando-os com a leveza integradora do amor divino.
Já não temos direito de temer o novo, não há mais imposição com exclusão. É o sopro que nos conduz, ninguém o domina; não sabemos de onde vem e menos ainda para onde nos leva, senão para vida mais plena, para convivência mais participativa. Agora não faz mais sentido haver discriminação entre cristãos e judeus nem oposição entre gregos e romanos. Mulher e homem, pecador e justo, ateu e religioso podem reconhecer-se irmãos; e devem valorizar-se, confraternizar-se sem direito de fazer acepção de pessoas. Esta é a ponte de acesso a uma nova luz: ter fome da verdade e sede de justiça; sair do rigor de uma religiosidade ultrapassada e ir ao encontro dos outros para alcançar o frescor do novo.
Os arautos do medo, os diplomados no poder, os autores da exclusão, os incendiários das fogueiras, os organizadores das cruzadas, os soldados das missões, os fanáticos da disciplina, os doutores da alienação, os senhores do infantilismo e os algozes da centralização correm risco de se fazer traidores do Espírito. Batizar-se no Espírito tem a ver com abertura, mobilidade, acolhida, renovação, espaço de participação e comunhão. O clima seja de confiança festiva e de uma permanente conversão. Nunca ninguém está pronto. Todos temos de renascer. É Pentecostes. A força transformadora do amor se faz dádiva e oferta.
Pelo Espírito somos católicos; isto é, globalizados, universais; não de uma categoria só, mas todos unidos no amor que transcende fronteiras. Dispomo-nos a ir em direção, uns dos outros. Até mesmo ao encontro dos que estão fora de algum esquema ou norma: judeus, pecadores, recasados, ateus, católicos, espíritas, evangélicos, agnósticos, budistas, islâmicos. Todos, tocados pela gratuidade divina, somos convidados à Mesa do Amor que renova, inclui e rejuvenesce. A irrupção do Espírito só é ameaça para os amantes da lei, para os de coração tacanho, para os reféns do poder.
Renascer do Espírito”... Não foi nada fácil para Paulo e Pedro, e continua sendo difícil para Papas, para Bispos e padres, para cada um de nós. Pentecostes se refere a todos, indistintamente. Fala de um fogo que pousa sobre cada um, a fim de que abandonemos nosso aprisionamento, acima de religião, nacionalidade, cultura e outras escolhas particulares. Eis o grande e verdadeiro milagre: todos e cada um em particular somos abordados por Deus, envolvidos por seu amor, conduzidos por sua sabedoria como participantes das maravilhas que seu Espírito realiza.
Pentecostes é a festa da diversidade em busca da integração, da unidade com expressões multifacetadas. Aqui, o dinamismo da fé derruba muros e constrói pontes. Pentecostes é a festa da humanidade que depõe as armas, desiste de ver no diferente um inimigo e transforma o poder em uma mobilização geral para renovar as relações. Pentecostes simboliza a Paz Universal, a Humanidade toda em Deus.
Pentecostes é a nova Lei do Espírito que nos dá uma coesão interior: a fé se torna braço, a esperança se faz coragem e o amor se revela porta aberta a acolher os diferentes. Pentecostes é o ensaio de sempre. Vamos recomeçar. Nunca é tarde. A hora é agora. De ora em diante, o decisivo será este "sopro" do Espírito. Ele é "a alma da Igreja"; o coração de nossa vida de fé. Nesta Celebração, selemos a Aliança – Deus conosco, em tudo, para sempre. Assim seja!
ESPERANÇA – Há, entre nós, pessoas que se deixam impelir pela esperança. Com fé, rezam: “Se não é o Senhor que constrói a casa, pouco adianta o trabalho dos pedreiros.”
A vida não começa nem termina em cada um de nós. Mas, para desenvolver-se no todo que nos cerca, ela passa por nós e precisa de nossa colaboração. Só assim, vida e história crescem; mas se nos omitimos, elas definham. Quem reconhece essa verdade, acolhe o germe da esperança, que está na base,
na origem de todas as realizações.
CRISTIANISMO – A essência do Cristianismo está expressa na “cruz”, seu símbolo por excelência. Lembra a morte como gesto extremado de amor feito doação; lembra o mais generoso engajamento contra tudo o que ameaça, oprime e desvaloriza a vida e a pessoa humana; lembra a solidariedade com os pequenos e todos os que sofrem. Lembra, sobretudo,
a Ressurreição como plenitude de vida, oriunda do amor gratuito do Pai.
Enfim, lembra a comum-união entre o céu e a terra, entre a eternidade e o tempo, entre o espírito e a
matéria, entre Deus e os Homens.
CARNAVAL – Originalmente, o Carnaval era um tempo de crítica sadia à ordem social existente. Em clima de festa popular, dava-se vazão à crítica contra as vaidades na vida social, política e religiosa. Graças a caricaturas, que funcionavam como espelho, os homens do poder eram confrontados com a falta de bom senso no desempenho cotidiano de suas tarefas. Mais do que nunca precisamos desse Carnaval, porque as pessoas levam-se demasiadamente a sério. Afinal palhaços e loucos são todos que, no palco da história, perseguem autoridade, posse, fama, poder e status, como se fossem fonte autêntica de felicidade e paz. Se o Carnaval se deturpou, vamos permitir que uma leitura, encontro ou meditação mostrem, com clareza, que a sabedoria deste mundo é loucura...
IGREJA PROFÉTICA – Comunidade de irmãos sempre em busca de vida melhor para todos, ou instituição autoritária em torno de dogmas e disciplinas? Irmã sensível a todo apelo de
colaboração libertadora, ou doutora autosuficiente, distante da efervescência histórica? Escola de espiritualismo que paira
acima dos fatos, ou pedagoga de uma fé-compromisso dentro do existir politizado? Serviço generoso a favor da paz entre classes e povos, ou combate permanente contra desvios de crenças e comportamentos? Impulso missionário que irradia a novidade evangélica, ou repetidora acomodada de lições já ultrapassadas?
A VIDA EM COMUNIDADE é o melhor antídoto contra a força corrosiva do individualismo prepotente. De fato, a vivência comunitária, baseada na participação e ligada aos objetivos de uma crescente comunhão, supera o individualismo, pelo esforço de superar problemas, suscitar lealdade coletiva, compromisso, solidariedade e ternura.
Requer-se resistência contra a fatalidade de eventos trágicos que, porventura, nos sucedem. Não podemos, simplesmente, nos resignar com tudo que nos acontece. Carecemos da ALEGRIA da novidade, capaz de nos libertar do conformismo e de nos estimular a transformar situações e a dinamizar o exercício de esponsabilidades.
Jesus sabia envolver-se com os outros, mostrando-se capaz de socorrer as pessoas na fragilidade de sua condição pessoal e social. (Mat. 9,36)
É o que se chama MISERICÓRDIA. Trata-se da virtude
que faz arriscar o confronto com a vulnerabilidade do outro, enquanto familiariza com a própria pequenez e grandeza. O que há de mais nobre no ser humano é essa sensibilidade pelo outro, em sua dor, carência e sofrimento. Mas ela pode corromper-se facilmente. Misericórdia sem práxis é sentimentalismo alienante,
como eficiência somente funcional não passa de voluntarismo desumano ou de abuso paternalista do poder.
EXCELÊNCIA DO HUMOR – À guisa de um tônico, o bom humor equilibra, estimula, alivia e relativiza a nossa participação nas agitadas peripécias da vida cotidiana.
Suscita um estado de ânimo que garante ao comportamento a capacidade de defender e de promover consistência e saúde na dimensão psíquica e social do existir. A seriedade balofa do raciocínio lógico tende a isolar fatos e situações. Ao revelar a comicidade escondida em tudo e em todos, o humor faz abrir brechas na rigidez de ideologias e dogmatismos, salva da acidez de extremismos.
NATAL, HOJE E SEMPRE
Natal convoca todos para integrar o
sagrado no profano.
Motivar para a cidadania é o sentido do Natal.
Servir a Deus no próximo é valorizar o Natal.
Semear bênçãos no cotidiano faz
acontecer o Natal.
Natal: em infância e velhice, Deus se faz oferta.
Confraternizar o viver é partilhar o amor do Natal.
Natal se atualiza em gestos de promover excluídos.
Exercer a dignidade de cidadãoé valorizar o Natal.
Natal se realiza no socorroa os esquecidos
e ignorados.
Natal se festeja ao aquecer relações fraternas.
Ao nos solidarizar em desafios
celebramos o Natal.
Ternura no serviço do poder enobrece o Natal.
Conscientizar da responsabilidadeé
ensaiar o Natal.
Natal se realiza por unir pessoas e partilhar bens.
Assumir a vida em seus desafiosé concluir o Natal.
Ao envolver outros no perdão, acontece o Natal.
Celebrar a gratidão é aplaudir o Natal.
Natal convoca e educa para construir igualdade.
Natal é braço estendido, horizonte ampliado.
Ao se promover amor e justiça, anuncia-se o Natal.
Natal nos mobiliza a fim de investir nossos dons.
Natal pede que, zelosos, demos rumo ao viver.
Sem diminuir oposições, deturpamos
o sentido do Natal.
Reconciliados no bem fazer, solenizamos o Natal.
Natal confraterniza pacíficos e pacifica adversários.
N A T A L
Natal, fonte de belo sonho,
chega alinhavando lembranças;
carrega faceiro o embrulho da vida,
ofertando a bênção de viver feliz.
Natal, momento passageiro,
mistério até o último sempre;
banha de luz todas as feridas,
na alegria distribuindo presentes.
Natal, espaço de silêncio,
atraindo segredos do Deus amigo;
noite misteriosa, repleta de magia,
dançando no deslizar da eternidade.
Natal, nobre cumplicidade divina.
Assume próximos e distantes,
aniversariando o nascer de cada um.
Deus, no mundo – luz para todos.
Natal, berço de esperança e paz;
menino embalado por tantos.
Reveste de cumplicidade o universo,
com amor em clima de festa.
Participar do infinito no arcabouço do finito.
Gerar Deus na espiritualidade do cotidiano.
Valorizar a dignidade de cada pessoa.
Combater toda forma de exclusão.
Festejar um amor sem fronteiras.
Solidarizar-se com os indefesos.
Dispensar um Deus justiceiro.
Oferta para todos no amor.
Nosso aliado, cúmplice.
VIVER A SALVAÇÃO
Na presença de Deus, sentir-se em casa,
ajudar outros a se tornar uma brasa.
Revestir de aconchego e segurança
quem, aflito, ainda carece de bonança.
Valorizar pessoas, solidarizar relações;
imergir em divina luz, dissolver solidões.
Fazer-se correnteza em gotas do divino,
e superar os passos de pequenino.
Cheio de graça em serviço de rica bênção,
suscitar em muitos alegre canção.
Generoso e criativo em doação de amor,
iniciar cooperação apesar de alguma dor.
Em graça abundante, recolher-se no amor
e, em gratuidade, ofertar uma flor.
Espelhar-se no rosto de Deus, virado para nós;
alegrar-se na pertença, nunca sentir-se a sós.
Viver em clima de paz e liberdade;
nunca duvidar: a vitória será da bondade.
Capazes de Deus, em Jesus sempre vitoriosos;
ao findar a caminhada, ainda gloriosos.
Sim, em Deus-Pai, filhos nos reconhecemos;
revestidos do Espírito sempre viveremos.
Ser muito mais do que conseguimos ser;
e, no coração de Deus, felizes agradecer.
Missa do dia 18.05.14
A S C E N S Ã O
A morte-ressurreição de Jesus consagrou a aprendizagem de seus discípulos(as). De um lado, a Religião do Dever com tradição; do outro lado, a Religião do Reino com vida de qualidade. Ali, devoções: oração, jejum, esmola; aqui, a gratuidade–compaixão, entrega confiante, gestos de lava-pés. De um lado, a observância legal, justiça-cobrança com exclusão; do outro lado, o amor–perdão com inclusão.
A mudança havia sido grande demais para ser assimilada na breve duração da convivência, cruelmente interrompida. Desânimo pela frustração. Dera tudo errado. A Escola de Sonho se fez experiência de derrota. No fim, a morte. A casa desmoronou. Por alguns dias. A perda se fez confronto com riqueza incomum; desânimo se fez limiar da grande descoberta. O testemunho de Jesus passou a brilhar.
Mudança radical. O “espírito de Jesus” os impele. Não como doutores da lei nem como mestres de disciplina, porém como “testemunhas” de um amor que transpõe as fronteiras de culpa, medo e exclusão. A inclusão é o objetivo. O Pai em mim, eu no Pai; vós em mim, eu em vós. Todos, um só. A Comunhão. Barreiras são eliminadas, muros derrubados, portas abertas. Não há judeu nem grego.
No sonho de Jesus o “renascer”: respeito, compaixão, acolhida, lava-pés - comunhão graças à participação. Céu e terra congregados no amor que confraterniza, transforma, liberta. O objetivo é a festa em torno da Mesa. Ascensão. Não é Jesus que sobe para o céu; a terra estremece pelo convite de acolher o céu. Não podemos mais fugir do sonho. A missão é: fazer a terra habitável para todos.
A religião, em matizes variados, há de mostrar-se acolhedora; o poder se despoje de vaidade e prepotência e se faça serviço libertador. Na convivência, grandes se ponham de joelhos, valorizando os pequenos. É Ascensão. Em Jesus, o Deus que desce. Ele promove todos através de nós – Estado, Escola, Família e Igreja. Ascensão: o coração humano navega no sopro do Espírito a serviço da BOA NOVA.
RELIGIÃO INSERIDA NA VIDA.
VIDA SOB NOSSOS CUIDADOS
Partes no Todo
Outono. Os dias encurtando, vegetação a encolher-se;
clima frio, vida embrulhada, natureza em descanso – aparentemente – preparando-se para o futuro - o renascer.
Por que, então, perder-se no presente?
Até o negativo é roupagem de promessa. Sempre foi - assim será.
Não é a alternância de estações uma forma de humildade
a conter uma fecunda promessa? De fato, somos quais ‘folhas’
de árvore, hoje balançando no alto, amanhã prostradas no chão, abrindo espaço para futuras gerações. Gratos ao efêmero na vida,
sejamos acolhedores do milagre que reinicia. Finitude abençoada.
Pior seria, caso assim não fosse: definharíamos sem função
para o futuro. Se a história deve tanto a nós, a natureza nos sustenta, enquanto a vida vale pela felicidade do bem-estar.
Certo é que nosso existir se artificializou bastante.
O planeta nos há de ameaçar e até o clima se desequilibrar?
A tecnologia nos confronta com o que tanto abominamos:
terremotos, guerras, violências, desastres -
irresponsabilidades cidadãs, políticas e sociais.
Formas tantas de desrespeito, de exclusão e de crueldade.
Para muitos a degradação aumenta, a vida se mostra violenta
e, havendo ameaças de toda espécie, mesmo assim, nosso mundo
é melhor que em todos os tempos que nos precederam.
Se as folhas caiam da árvore, ficando essa exposta em sua nudez,
no interior da mesma nova vida germina promissora.
Na convivência, os direitos progrediram, a natureza é tratada
com mais respeito, o nível da vida em geral tem melhorado.
No começo do século XX, éramos 1 bilhão; em 2050 seremos
quase 10 bilhões. Nos primeiros 18 séculos da era cristã,
o nível de vida e a média de idade permaneceram iguais.
Como era difícil e sofrida a vida de nossos antepassados!
De tudo que, hoje, nos castiga e ameaça, pouco restará.
Afinal, temos alguma semelhança com as folhas secas de árvore,
que o vento usa como brinquedo no chão.
Porém, somos mais, bem mais, sobretudo ao nos fazermos
promessa para o futuro, mostrando-nos responsáveis.
Afinal, o planeta Terra é nossa ‘Mãe’. Começou há quase
14 bilhões de anos! Devemos tudo a estrelas, que pereceram
bilhões de anos atrás. Surgiu a matéria, aglomerando-se e girando,
dando origem a bilhões de galáxias com suas estrelas
que ninguém conta. Há quase 5 bilhões de anos surgiu o sol
e seus planetas, entre eles a ‘terra’, nossa mãe, coberta de água.
Sua atmosfera é rica em oxigênio que nos protege dos bombardeios
da radiação solar e dos raios cósmicos. Isso possibilita a vida
que explode em uma criatividade infinita,
usando o presente para criar o futuro.
Esquecidos de nossas origens, nos mostramos ingratos e rebeldes.
Oxalá nos façamos alunos agradecidos da História,
não só da natureza, mas também da civilização.
Elas são as mais valiosas mães, sem elas nossa mãe nem existiria.
Frei Cláudio van Balen
Cfr: A.C.Sponville, Comme les feuilles des arbres, Le Monde des Religions 2013, p.82
M. Gleiser, Pai Cosmo, mãe Terra, FSP, 11/05/14
ABENÇOADO
Salvação é graça-oferta,
- através de tudo e todos -
chega mim e me envolve.
Ou não passa de ledo engano
com a dor me confronta.
Bem-Aventurado eu me sinta,
sempre, graças à realidade;
ou eu mesmo me aprisiono
no inferno que só eu escolho.
Sim, felicidade sinto ou desgraça.
Querer merecer a Salvação,
fazer da perfeição um mérito?
No mínimo é ignorância;
no máximo, é loucura.
Agraciado me sinta, em tudo.
Sonho de loucura é salvar-me;
conquistar o que já possuo.
Tornar-me o que já sou?
É de graça que impera a bênção.
No dia a dia, eu seja o que sou!
Só a mim cabe escolher:
viver bem-aventurado ou não.
Preferir a angústia à felicidade?
Priorizar o bem-estar à desgraça.
Mergulhar no paraíso ou no inferno.
A mim, a escolha; desde já.
25 / 05 / 2014
PRESÉPIO – GRANDEZA SIMPLES
No passado, em meio ao luxo da Igreja,
Francisco propôs sobriedade.
A partir de então, vigora a versão de que
Jesus nasceu em um ‘estábulo’,
sendo que o próprio Francisco
abandonara o luxo da casa paterna.
Há, no relato, algo que não
aconteceu – gruta...– porém é ‘verdade’,
da mesma forma, tanto para Francisco
como para Jesus – na pobreza que abraçaram.
Algo assim com relação a Maria:
envolvida pelo Espírito,
ela engravidou, nosentido de que seu filho,
à luz da fé, se revelou ‘filho’ de Deus
de tão marcadopelo espírito ‘divino’.
À luz da fé, há gratuidade divina em toda concepção,
sendo que a ‘vida’ emana do mistério de Deus.
E isso vale para toda pessoaque, neste mundo,
nasce de pai e mãe. Sim, aqui, há algo mais.
Na história do povo judeu,
há narrativas sobre pessoas que
nasceram de mães inférteis ou
idosas demais para poder gerar filhos.
O que parece impossível ‘acontece’.
É para salientar que a criança nascida
é alguém com missão muito ‘especial’.
Aliás, o povo judeu se originou de Abraão e Sara,
muito idosos; é o que simboliza
e confirma sua pertença ao ‘Povo de Deus’.
Jesus, sendo especial,
tem de ser gerado de forma singular.
Se profetas nascem de mães estéreis,
Jesus nasce de mãe virgem:
não por vontade de um homem,
mas pela vontade de Deus,
como escreve o evangelista João.
Tal circunstância simboliza o que
Jesus realmente é: Emanuel – Deus-conosco.
Eis a lição: ao servir uns a outros,
somos de fato ‘filhos de Deus’.